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GLOBAL ART

By Miguel Westerberg

Alma de um Artista - MIGUEL WESTERBERG Posté le Samedi 15 Mars 2008 à 19h26

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Noite de sábado, o meu apartamento se encontra às escuras. Observo o cigarro a queimar lentamente sobre um velho cinzeiro que fora me oferecido há muito tempo. A luz que vem de fora cria sombras sobre os moveis. Olho demoradamente para elas e começo a relembrar partes da minha vida, como quando era apenas uma criança. As horas passam e sinto-me sufocado entre quatro paredes! Hoje ninguém me telefonou e o relógio de século badala um tic-tac repetitivo que me deixa impaciente. Um dia destes deixo de dar corda nele e acabo com essa agonia. Olho pela janela e sinto que a cidade esta calma, apenas alguns carros rompem o silencio ao percorrerem a calada da noite com seus viajantes despreocupados, fato que me leva a pensar no ocorrido do dia anterior: naquele mesmo cruzamento, uma jovem de apenas 19 anos fora assassinada a sangue frio por dois indivíduos, que a tentaram assaltar! Meu Deus, apenas 19 anos, com uma vida pela frente, mas tivera um fim tão trágico e chocante! Aquela imagem ficou na mente durante todo dia, por isso posso lembrar de cada detalhe com clareza, mas isso não me ajuda em nada agora, pois preciso dormir e por mais que tente não consigo. Acho que preciso pensar em alguma coisa positiva, para aquietar o meu espírito que se encontra tão perturbado e abatido.

Por vezes incontáveis tento idealizar algo novo, sem muito sucesso, pois tudo já está demasiado gasto. Minha mente fica turva, cada um de meus pensamentos se desmaterializa e volta ao pó. Podia começar a pintar uma tela ou a escrever um poema, mas as únicas cores que consigo pegar é vermelho e negro. Quanto às palavras, mantenho me suspenso entre a dor e o sofrimento, que não desejo a ninguém. Por que será que a morte permanece como um enigma sem solução? Afinal de contas, o que fazemos aqui ou qual o fundamento da existência? Tenho consciência que todo mundo se interroga sobre estas questões, mas não obtém nenhuma resposta plausível; outros simplesmente silenciam suas perturbações e se refugiam em um submundo de noitadas proporcionadas pelo entorpecimento do álcool e do sexo casual. À noite se vestem de prado e durante o dia escondem as cicatrizes que tanto os perturbam. Um sorriso forjado é o quanto basta para enganar a morte, ademais são simplesmente palavras sobrepostas umas as outras, que ninguém mais as compreendem.

Já passa das duas da manha. O tempo permanece completamente estático, de forma que uma monotonia entediante invade o meu apartamento sem nem mesmo me pedir licença; na tentativa inútil de afastá-la eu tento ler um pouco, mas não tenho nenhum animo! Olho para a parede e vejo uma tela que pintei na semana passada. Uma pequena aquarela que retrata um recanto de Lisboa muito visitado por turistas: o elétrico com destino ao bairro da Graça, que da característica típica a cidade. A pintura ficou bem expressiva, então refleti um pouco e deduzi que poderia obter uns bons trocados com a venda do quadro. Esperei o dia clarear, levantei-me com os primeiros raios de sol e me dirigi a Rua Augusta, a fim de conseguir um bom preço por ela. Fiquei horas para vendê-la, mas por fim um turista inglês a comprou por trinta euros. Confesso que a minha sorte é que eu posso contar com a ajuda de uma das minhas irmãs. É ela que paga a renda do meu apartamento, caso contrário, há muito que estaria a viver na rua. Estou que nem Van Gogh, que por anos viveu apenas com a ajuda que seu irmão Theo lhe dava. Já percebi que não consigo viver em comunidade, sou demasiado solitário, lunático e um sonhador incorrigível. Nada mais do que isso! Com os trinta euros fui ao supermercado e comprei alguns mantimentos essenciais, mas pouco mais do que sete euros me sobraram. A vida dos artistas é assim mesmo; desculpem o plural, somos uns mal-afortunados, sempre vestidos de negro, mas as pessoas ignoram o porquê de nos vestirmos assim. Muitos pensam que é para estar de acordo com os padrões estabelecidos pela moda, mas a verdade é bem diferente, afinal de contas, geralmente, as aparências enganam. Na realidade nós não temos é como comprar roupas novas. O preto serve-nos de uma espécie de camuflagem, então não é de se admirar que minhas camisas, calças, casacos e as meias sejam pretas. Só o meu cabelo é que é loiro com algumas mexas brancas para contrastar, de resto tudo em mim é triste.
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Enfim, quarenta e sete anos e a vida pouco ou nada me deu. Trabalhei como guarda noturno numa escola do ministério da educação por aproximadamente 10 anos, mas quando pedi demissão, não recebi coisa alguma. Ainda bem que fiz grandes amizades e assim não foram dez anos de completa inutilidade. Refletindo um pouco melhor agora, acho que fiz mal, pois tomei uma decisão um tanto precipitada, mas, vindo de mim, já era de se esperar, afinal nunca paro para pensar e por isso, quando caio na real, já é tarde demais. Muitos chamam isso de inconseqüência, mas eu acho que é viver o momento mesmo que tenha conseqüências desastrosas. A única vantagem de não se trabalhar para o estado é que nos tornamos livres de um infeliz ordenado, isto é, se formos apenas funcionários de segunda categoria, como era o meu caso.

Quando paro para pensar o que realmente queria da vida, chego à conclusão de que queria mesmo era ser rico e estou ciente de que não sou o único a pensar assim. Excentricidade minha? Que seja então, melhor do que ser hipócrita e não expor meus verdadeiros desejos e sentimentos, devido a dogmas religiosos ou paradigmas estabelecidos por grupos sociais para beneficio próprio como: "só os pobres herdarão o reino dos céus". Isso me causa risos. Que ponto de doutrina é este que ainda rende milhões as igrejas? Tenho plena consciência que esse sonho me é excêntrico, mas o que posso fazer, já que aqui estou e a minha vida não passa disto? Entrego-me todas as noites aos meus devaneios e viajo até casa dos meus sonhos, numa colina com vista para mar e imagino uma leve brisa de maresia a envolver meu rosto. Sonhos... Nada mais que sonhos! Lembro-me que quando era adolescente, o sonho de ser um artista plástico reconhecido era tudo que eu tinha e durante anos a fio eu lutei constantemente, sem nenhum sucesso. Nenhuma porta se abriu e a minha face já se encontrava desfigurada de tanta frustração. Sempre que entrava numa galeria de arte, a resposta era sempre a mesma: infelizmente já temos artistas suficientes, ou quem sabe, volte daqui a uns anos, pode ser que venhamos a precisar. Nem se quer interessavam-se para ver uma de minhas telas. Imagine só o que é ouvir isto durante uma vida inteira! E o pior, sempre as mesmas coisas, as mesmas palavras, os mesmos sorrisos e olhares disfarçados. Parece que existe uma associação, aonde se reúnem para ensaiar e decidir as desculpas esfarrapadas que nos dirão. Esquecem do senso de percepção que obtemos com as lastimáveis experiências vividas. É inacreditável, que sempre que falo com eles, me venham com a mesma conversa mole.
Como não os consegui convencer, fui tentar em outros lugares apropriados, mas que não deixam de ser freqüentados por pessoas sensíveis, que admiram a arte real, não pelas sugestões dela extraídas, mas sim pela inspiração dos artistas e não por um protótipo pré-definido pelos proprietários de galerias. A maioria pensa que pintar é copiar uma tendência, mas acho que a isso se da o nome de fotografia, não? Entre os novos lugares que escolhi para expor as minhas telas, estão os famosos cafés, livrarias e restaurantes. Por falar em restaurantes, uma vez deixei algumas telas expostas em um que fica na baixa, na Rua Garret, mas tive um tremendo azar. O proprietário faliu e dez das minhas telas, dentro de uma linha cubista, ficaram lá retidas. Tentei retira-las, mas infelizmente todos os bens que havia dentro do restaurante ficaram na mão de um banco para irem a leilão, então desisti e nunca mais lá voltei.
Tive melhor sorte numa livraria, que fica na baixa – chiado em Lisboa, precisamente na Calçada do Sacramento que vai dar no Largo do Carmo. Andava procurando livros de segunda mão, já que são bem mais baratos de preferência os relacionados à literatura francesa. Dias antes tinha estado na Calçada do Conde e por lá comprei vários livros, A saga dos Rougon-Macquart de Emile Zola e um outro de Balzac, mas a leitura de Balzac era demasiadamente romântica e não fazia o meu gênero. Sendo assim aproveitei a oportunidade de ali estar para adquirir algumas autobiografias. Confesso que elas me fascinam de tal forma que não consigo resisti-las. Assim sai de lá com tantos livros que mal conseguia carrega-los, mas foi ao passar pela Calçada do Sacramento que algo inesperado aconteceu: quando pela primeira vez lá entrei, a minha intenção era de poder adquirir alguns livros por um preço módico, porém reparei que o proprietário tinha paixão por pintura e escultura. Em cada recanto do estabelecimento havia pinturas e esculturas de grande beleza, pertencente a vários artistas com renome e outros anônimos. O proprietário deveria ter os seus setenta anos, era calvo, de baixa estatura, vestia se bem e no olhar percebia-se certa perspicácia, bem típico português. Enquanto dava uma olhada pelas estantes e pinturas, ele gentilmente pegou os meus livros e os colocou sobre o seu balcão. Diante de tamanha delicadeza eu senti necessidade de retribuir. Elogiei seu espaço comercial e disse-lhe que era artistas plástico. Desse primeiro contato brotou uma grande amizade e para resumir já está com bem mais de sete anos que expus meu trabalho por lá. Sua sabedoria me cativou de tal modo que era difícil evitar uma passagem por lá de vez em quando. Ele me lembrava muito o Ambroise Vollard, um grande marchand que contribuiu com o desenvolvimento da arte ao lançar vários artistas como Picasso, Van Gogh, Paul Cézanne, Rouault e Gauguin.
Mesmo quando estava na América Latina trocávamos idéias por correspondência e no meu ultimo regresso a Lisboa, trouxe comigo algumas telas, que ele expusera pela ultima vez no seu espaço comercial, pois a sua idade avançada o impediu de prosseguir com as suas atividades comerciais, assim também como o desenvolvimento dos meios de comunicação, que se tornou um grande empecilho para os pequenos comerciantes, afetando assim todos eles. Com o grande avanço da tecnologia as pessoas passaram a ler menos e buscar mais entretenimento na internet; o globalismo se propagou e juntamente com ele, houve um grande aumento no comercio chinês, que devido aos seus preços baixos, atraiam mais pessoas, mesmo com baixa qualidade das suas mercadorias.
Hoje em dia a galeria do meu velho amigo se encontra fechada o letreiro escrito por cima da porta: "Livraria e Galeria Campelo" balança ao ritmo do vento, se desgastando juntamente com a cidade. Nunca mais soube nada a cerca dele e partir daí a minha vida entrou em declínio, devido à falta que a sua força e motivação me traziam. Assim como eu, muitos outros artistas sofreram, pois ele era um porto seguro para nós.

Do livro : ALMA DE UM ARTISTA
De: MIGUEL WESTERBERG

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